O Pianista de Hotel, Rodrigo Guedes de Carvalho


Esta não foi a minha primeira incursão pela escrita de RGC, mas quase poderia ter sido, tal a sensação de agradável descoberta que me suscitou. A primeira foi A Casa Quieta. No entanto, foi já há tanto tempo, que pouco recordo e não garanto sequer se o que recordo condiz com o que li. Tenho a vaga memória de uma família nuclear (talvez de 2 filhos), uma casa de família no interior à qual regressam (talvez de férias), mas sobretudo de uma ambiência quase fantasmagórica, como se os personagens não habitassem a casa, mas apenas por ela deambulassem. Será? Daqui a uns meses tiro as teimas, quando ler novamente o livro a propósito da Comunidade de Leitores da Penha de França.
Mas falemos deste Pianista… e o desafio é sintetizar os conceitos que o autor nos explora magistralmente através da interacção de um leque de personagens que nos cativa e que, pela sua diversidade, nos permite, enquanto leitores, estabelecer uma identificação, seja com os temas, seja com os personagens. A história é co-protagonizada por Maria Luísa, uma jovem solitária, apesar de fisicamente atraente, através de quem o autor explora a noção de “o nosso corpo chega sempre primeiro” aos outros e condiciona sempre o modo como os outros nos percebem. O co-protagonismo é partilhado com Luís Gustavo, um jovem enfermeiro que num momento de descrença profissional descobre o poder redentor da música e através de quem se explora o conceito da música como tradutora do indizível e como ponte de comunicação entre dimensões. Em redor destes, um rol de outros personagens são apresentadas sempre com um nome duplo, representando a dualidade com que sempre nos debatemos: o visível e o invisível. Porque se “o essencial é invisível aos olhos”, todos temos uma imagem, um corpo que nos representa, mas somos ainda uma amálgama complexa de tudo o que não mostramos, mas contemos nos nossos jardins proibidos. Apenas um personagem tem direito a um terceiro nome, Sérgio Ribeiro Leão, talvez por ser a personagem que se nos apresenta como tendo – através da música – atingido um equilíbrio entre visível e invisível.
Esta é também uma história de desencontro contínuo. Um limbo. Em que os personagens são como que mortos em vida e os mortos teimam em permanecer num mesmo plano dimensional. Todos, de certo modo se cruzam, mas nenhum se encontra. E apenas a música ainda alenta uns e outros.
Revisão: Clara Boléo | Editora: Dom Quixote | Local: Alfragide | Edição/Ano: 1ª, Maio 2017 | Impressão: Guide | Págs.: 468 | Capa: Rui Garrido | ISBN: 978-972-20-6270-1 | DL: 423992/17 | Localização: BLX PG 82P-31/CAR (80305310)

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