O sol nasce sempre (fiesta), Ernest Hemingway

Já manifestei anteriormente o meu preconceito sobre a obra de Hemingway, que me levou sempre a passar-lhe ao lado. Este preconceito assenta sobre alguns dos seus temas (tourada, corridas de touros, caça e pesca, boxe, guerra) e o seu universo, aparentemente, única e exclusivamente masculino. No entanto, sempre me intrigou o interesse suscitado pela sua obra e o facto de a sua escrita ser uma sugestão incontornável a quem se quer, exactamente, dedicar à escrita. Foi neste estado de espírito que me dediquei à leitura deste seu primeiro romance.
Em termos de estrutura, a obra está dividida em três livros, a que chamei: Paris, Pamplona e Regresso. Quanto ao enredo... bem, tenho dificuldade em dizer que o mesmo tem um enredo, quando a sua acção parece resumir-se à descrição do quotidiano de um grupo de amigos durante determinado período de tempo, que antecede a ida para as festas da cidade espanhola, as peripécias da chegada, a estada e, depois, o consecutivo desmembrar do grupo.
E quem é este grupo? Jacob/Jake Barnes, jornalista e narrador, veterano da primeira grande guerra e ferido em combate; Lady Brett Ashley, actualmente noiva de Mike campbell em processo de divórcio de Lord Ashley, que nunca surge na trama, cujo casamento parece ter sido traumático, pautado por violência doméstica; Mike Campbell, em ressaca de um processo de falência, procura aproveitar a vida o melhor possível, sem nunca esconder a sua condição económica, vivendo de pequenos expedientes e da bondade de amigos e conhecidos; Robert Cohn, escritor a debater-se com a falta de progresso do seu segundo livro; e Bill, também escritor. Quem liga estas personagens é exatamente Brett, que, estando noiva de Mike, tem um caso esporádico com Cohn, e uma amizade com Jake, que nunca passa a um plano físico devido a um ferimento do mesmo na guerra que o terá tornado impotente. Em Espanha, envolver-se-á com um toureiro, o que desestabilizará o equilibro precário deste pequeno grupo, que se separa, restando apenas a amizade entre Brett e Jake.
O que gostei, o que não gostei e o que consegui perceber sobre o fascínio que Hemingway provoca:
+) a não crítica do comportamento sexual livre e aberto de Brett. Este é do conhecimento de todos e ninguém a renega por isso. Só Cohn, que não respeita essa liberdade, e a quer só para si, é que, com os seus ciúmes, consegue provocar o desequilíbrio;
-) a descrição da denominada “geração perdida”, expressão cunhada por Gertrud Stein que assim descrevia a geração de artistas que entre a primeira guerra e a depressão pululavam na Europa, sobretudo em Paris;
+) creio que compreendo o fascínio pela sua escrita límpida, em que as acções procuram ser mais fortes pelas palavras e em que o exotismo de certas situações seriem autênticos deleites para as gerações da época.
Finda a sua leitura, que não me cativou (estava constantemente a lembrar-me de O Fio da Navalha e do quão uma época pode ser descrita de modos tão diferentes) mas que, no entanto, me deu esbateu o preconceito sobre os níveis de testosterona da sua escrita e me deixou curiosa para uma incursão futura, ainda por definir.
Título Original: The sun Also Rises | Tradução: Jorge de Sena (+ Prefácio) | Editora: Livros do Brasil | Local: Carnaxide | Colecção: Clássicos da Literatua | Edição/Ano: 2007, setembro | Págs.: 264 | Capa: Daniel Barradas | ISBN: 978-972-2851-1 | DL: 261647/07 | Localização: BLX

Comentários