Há
uns meses atrás, revi Perigo Eminente, título português para o filme Blade
Runner original. Tinha na memória a mítica cena em que o vibrante olhar azul de
Rutger Hauer se extingue, cumprindo-se, assim, a sua programação andrónica que
possuía um prazo de validade.
Esta
era uma versão futurista de um frankenstein biónico que procurar ultrapassar os
horizontes (neste caso temporais) a que o seu criador o veta. Criador este que,
como todos os demais, querem sempre que as suas criaturas cumpram os seus
objectivos e nunca as aceitam como potencialmente iguais, já para não dizer
superiores. Mas, tal como todas as criaturas, estas rebelam-se. Para as
capturar e exterminar, entra em cena Deckard. Mas, ah a ironia, este acaba por
se apaixonar por um modelo mais recente de Replicantes (nome aqui dado aos
androides), que não possui o tal prazo de validade, e acabam por fugir, também
eles, à perseguição.
O
que nos traz a Blade Runner 2049…
E
(spoiler alert!), afinal, dizem-nos que o próprio Deckard é um Replicante e a
sua relação com Rachel possibilitou um tremendo avanço evolutivo, até ao
momento, irreplicável. O que nos leva a uma nova perseguição, que, não sendo
surpreendente, tem mais reviravoltas e elementos de despiste do filme original.
Ou seja, em termos de enredo, embora possibilitasse reflexões profundas, o
filme original tinha uma história linear e simples. O filme actual (que não é
um remake, mas uma sequela) já apresenta estratégias narrativas mais complexas,
embora estejamos todos já tão habituados às mesmas, cujo resultado não é
exatamente nenhuma surpresa. É-nos dada toda a informação, apenas temos de
ligar os pontos de forma diferente da que nos é primeiramente apresentada.
A
maior dificuldade na ligação desses pontos não é a nível de coerência interna,
mas sim de relacionamento com a nossa realidade. Ou seja, as questões ou a
realidade explorada no filme original continua a estar mais próxima de nós, o
que nos permite reflectir, mas não nos suscita dúvidas, digamos, “técnicas”. Já
a actual proposta de enredo, mantem as mesmas possibilidades de reflexão, mas é
muito mais distante do nosso estado actual de realidade, o que nos deixa mais
dúvidas “técnicas” que aumentam a sensação de inverosimilhança. Dúvidas essas,
claro, que não são respondidas, nem sequer apontados caminhos.
Em
termos de estética e ambiência, há um excelente compromisso entre o original e
a incontornável evolução tecnológica e possibilidades digitais actuais. E, aí,
se possível, recomendo ver o filme no cinema (com ou sem outras opções mais
avançadas).
Uma das sensações que transparece neste filme é a de sentida homenagem ao filme de 1982 e nesse sentido nenhuma das personagens é esquecida, seja através da sua recuperação, seja na replicação de momentos chave da história. E a chuva transforma-se em neve...
Realização: Denis Villeneuve *
Argumento: Hampton
Fancher, Michael
Green * Elenco: Harrison Ford, Ryan Gosling, Ana de Armas, Dave Bautista,
Robin Wright,
Edward James
Olmos, Jared
Leto
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