Ainda estamos a aprender a
viver com algo que veio para ficar e cujas flutuações são incompreendidas e que
requer reacções desconhecidas. Muito se tem dito sobre como combater a
pandemia. Muitas teorias, todas com custos e consequências brutais para o nosso
modo de vida.
Na teoria, talvez a
estratégia da imunidade de grupo fosse a melhor. A protecção excessiva debilita
o sistema imunitário e a exposição provoca a criação de anti-corpos. Na prática,
e até se atingir o nível de imunidade de grupo desejável, perder-se-iam muitas
vidas pelo caminho. Enquanto fossem vidas alheias, podíamos ser empáticos com a
tristeza. Mas a probabilidade dizia-nos logo que não escaparíamos incólumes à
doença ou à perda de alguém. E isso é brutal. É sempre brutal quando nos toca a
nós, não ?
Não querendo pagar o custo
da perda excessiva de vidas, os governos arriscaram a estratégia do
confinamento. Que também nos trouxe outros custos colaterais. A economia, já se
sabe é um deles. Mas também no modo como nos relacionamos. Se a distância já era
um problema paradoxal dos nossos tempos, agora assumiu o seu ápice. Desaprendemos
o contacto físico como demonstração de afecto e a seu tempo desaprenderemos
também o afecto? Receio que seja um perigo bem real. E o que seremos nós sem
afecto? Qual o custo a longo prazo?
Por agora, demonstramos
afecto através do seu contrário: o afastamento. E se não conseguirmos voltar
atrás? Como se definirá afecto nos dicionários do futuro? Com que gramática
escreveremos as nossas relações futuras?
Por outro lado, estamos a
ser desafiados a olhar além de nós. Afinal, afastamos, não tanto para nos
proteger, mas proteger o outro. Pelo menos eu, que não quero pagar o custo
dessa perda. Cedemos a uma chantagem emocional que mudará a nossa vida enquanto
sociedade para sempre, ou priorizamos a nossa sobrevivência?
Mas afinal viver não é isso: tomar uma série de decisões cujo o impacto está sempre para além de nós, mesmo quando não o desejamos, mesmo quando não o prevemos?
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