Confinamento 2.0

Aqui vamos nós outra vez. E sempre as dúvidas: até que ponto é necessário? Até que ponto os moldes são eficazes? Até que ponto a nossa moldura mental está disponível para o que nos é solicitado?

As todas estas questões, as respostas parecem-me contraditórias. É necessário? Em vista dos números, sim. Em vista dos comportamentos e medidas, não é assim que lá vamos. A maior sensação é a de que falhámos pessoal e institucionalmente. Falhámos porque não colaborámos, não respeitámos, porque facilitámos. E continuamos a fazê-lo. A nível pessoal, e com a experiência entretanto adquirida, o que posso dizer é que vou tentar cumprir as orientações na medida do possível. E a medida do possível traduz-se no facto que não estarei completamente trancada em casa. Limitarei ao máximo saídas e interações, mas desta feita não abdicarei das famosas saídas higiénicas. São necessárias nessa vertente emocional e psicológica que no inicio não conhecíamos. Continuarei a observar que muitos não acatam de todo as orientações ou que o fazem deliberadamente de modo ineficaz. Sim, porque passado quase um ano nisto, o inconsciente já não é desculpa para muito.

Institucionalmente, falhámos na capacidade de prever ou acautelar um novo confinamento. O tempo que tivemos para preparar alternativas foi consumido em poucas concretizações. Regresso a casa com a sensação de deixei trabalho por fazer, de que poderia continuar a fazer parte do meu trabalho no local, que é necessário continuarmos a disponibilizar o nosso trabalho onde ele faz sentido – no local, que o que possa fazer em casa não vai muito além de preparação. Muita dela já efetuada no primeiro confinamento. Falharam algumas das respostas institucionais às nossas propostas de solução.

Neste novo confinamento, já não somos principiantes absolutos. Por isso, o sentimento de contradição é ainda mais notório. É verdade que não me vou desgastar do mesmo modo, afinal, não vale a pena. Mas custa-me ainda mais a contradição das regras, das excepções, de ver as situações de injustiça e os olhos marejados daqueles cuja subsistência se vê de novo ameaçada. Aqueles que amanhã poderão já não estar lá para tornar a nossa vida melhor.

Espero sinceramente que se consiga achatar a famosa curva, que consigamos dar tempo aos profissionais de saúde para não terem de tomar decisões de vida ou morte, de que saibamos atravessar este período com a serenidade perdida, que este não nos roube ninguém dos nossos círculos, ou que nos permita fazê-lo com dignidade.

A morte, a perda e o fim fazem parte da vida. Mas quando se encontram todos num mesmo ponto e local do tempo é algo avassalador. Espero que encontrem a força e a resistência para nos apoiar e continuar rumo ao fim do túnel.

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