Dos 4 livros que tinha
disponíveis para iniciar uma releitura do trabalho de SS, achei que deveria
começar exactamente pelo seu último trabalho, escrito enquanto perdia a batalha
para a ELA. Comecei então pelo adeus…
É difícil não ver neste
livro esse adeus, porque se cola ao que sabemos da doença do autor e pelo
seu registo familiar. Aliás, este é talvez o mais familiar que conheço dos seus
registos. Aqui a família é presente, conforto, apoio, amor e voz. Talvez o
oposto de muitos dos seus trabalhos e até a sua imagem de marca: um silêncio intransponível
e a incapacidade das personagens de demonstrar afecto. Aqui há uma palavra de
reconhecimento por isso que é a família funcional, quase sempre ausente da sua
obra.
Espião na primeira
pessoa. O porquê deste título num relato em que dois homens se observam do
outro lado da rua. Quem observa quem? Quem fica preso na observação? Serão realmente
dois homens? Dois homens diferentes? Ou o mesmo homem que se observa num
período anterior à doença e na incapacitação que a mesma provoca. O sentimento
de cisão numa pessoa, que é e não é simultaneamente a mesma pessoa. Ou cujo
corpo é o mesmo, mas tudo o resto que constitui a nossa identidade não,
fazendo-nos uma outra pessoa. Por isso é necessário espiar, não só para
perceber que é ou quem foi essa pessoa. Mas para perceber se ainda se é.
Título Original: Spy of
the first person | Tradução: Salvato Telles de Menezes | Revisão: João Assis
Gomes | Editora: Quetzal | Colecção: serpente emplumada | Local: LX |
Edição/Ano: 1ª, ago 2018 | Impressão: Bloco Gráfico | Págs.: 101 | Capa: Rui
Rodrigues | ISBN: 978-989-722-471-3
| DL: 442902/18 | Localização: BLX PG 82-312.9/SHE (80420783)
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