Tropel, Manuel Jorge Marmelo

Cheguei a este livro na sequência de ter incluído a leitura de Macaco Infinito no plano de leituras do CL do Palácio Galveias e de sentir necessidade de abrir o espaço ao diálogo com outra obra do mesmo autor. Estas não são as minhas primeiras leituras de MJM, embora das primeiras a memória não passe dos títulos e de uma muito ténue impressão. Afinal, estas têm cerca de 15 anos e depois disso, muitos outros autores e livros foram deixando a sua marca.

Primeiro, deixo uma impressão da evolução da escrita do autor. A sua abordagem está a tornar-se mais alegórica, no sentido de mesclar diversas situações ou referências para nos colocar perante um problema e nos levar à reflexão, sem no entanto procurar reproduzir uma situação, p. e. verídica especifica. Isso conduz à construção de um texto em que as personagens se nos apresentam como caricaturais, porque representam a amálgama de um tipo, e um tempo actual mas indefinido, que pode ser agora, mas podia ter sido no passado recente, como poderá ser num futuro próximo. Porque os problemas e confrontos com que o autor nos pretende levar não são de agora são, infelizmente, de sempre.

Em Tropel a desumanização chega-nos através de um grupo de caçadores numa região dos Balcãs nunca devidamente identificada, pois as suas fronteiras sofrem constantes alterações ao longo da história e dos conflitos que a pautam. Estes caçadores, cristalizados num modo de vida, não têm muitas perspectivas para além da manutenção do seu modo de vida. Um modo de vida que pode ser ameaçado pelo outro. Quem é o outro? O migrante que arrisca a vida para fugir à morte certa no seu país apenas para a encontrarem ao cruzar um pedaço de fronteira imaginária e se tornarem as presas da caça suprema.

Deste modo, o autor abordagem a indiferença com que o problema da emigração é tratado por autoridades nacionais, mas também pelos indivíduos incapazes de ver o humano nesses homens e mulheres, muitos deles, apenas a lutar para sobreviver. Como o outro é quase sempre visto como uma ameaça e por isso é necessário desativa-la, seja de que modo for. Como é que isso origina os nacionalismos extremos e o sentimento de supremacia, esse sentimento tão vago, tal como vaga é noção de fronteira na região escolhida pelo autor para colocar a sua trama. Uma região em que o conflito permanece culturalmente porque o outro é sempre o outro e o outro é uma ameaça.

Revisão: João Assis Gomes | Editora: Porto Editora | Coleção: língua comum | Local: porto | Edição/Ano: 1ª, set 2020 | Impressão: Bloco Gráfico | Págs.: 198 | Capa: alex Gozblau | ISBN:  978-972-0-03181-5 | DL: 471763/20 | Localização: BLX PG 82P-31/MAR (80465214)

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