Pão de Açúcar, Afonso Reis Cabral

Já há muito que queria fazer esta leitura, mas confesso que o tema me dava uma certa falta de coragem. Os temas duros, ainda para mais baseado num facto real, têm este efeito: causam-nos algumas reticências. Temos receio de nos confrontar com a maldade e a injustiça que, suspeitamos, pode haver em cada um de nós.

Pois, chegou o momento. Comecei a leitura lentamente, a adiar o inevitável confronto. Avancei e a cada passo fui apreciando as capacidades deste autor, que embora jovem, revela uma maturidade literária e um olhar próprio sobre o mundo. O embate chegou? Claro. E claro que me fez revoltou e revolta. Com a realidade que tentar apresentar, não como a presenta.

Como muitos poderão saber, o autor segue o grupo de jovens que em 2006 espancou até à morte Gisberta, uma mulher transsexual. O tema e a abordagem do autor tem-lhe valido criticas e reparos vários. Alguns terão alguma validade, outros revelarão desconhecimento do conteúdo e falta de compressão da intenção do autor. Afinal, mais facilmente vemos o que queremos ver, certo?

O que posso dizer? Que, mesmo que a ficção sobre a figura de Gisberta seja imperfeita – é uma ficção-, senti-a sempre respeitosa. Que percebermos o que motivou estes jovens não é desculpa-los, mas sim percebermos que, enquanto socieade, também falhámos com eles. E continuamos a falhar com certeza com tantos outros eles. E com tantas outras Gisbertas ou Robertos ou sejam quais forem os nomes de tantas realidades que não compreendemos nem parcial nem totalmente.

Esse é o grande mérito deste livro: confrontar-nos com a nossa incapacidade de, mais do que compreender, aceitar o outro diferente, nas suas fragilidades, mas também nas suas inúmeras coragens para mudar o seu destino.

Editora: D. Quixote | Revisão: Madalena Escourido | Local: LX | Edição/Ano: 1ª, set 2018  | Impressão: Eigal, IG  | Págs.: 262 | Capa: Rui Garrido | ISBN 978-972-20-6599-3 | DL: 444067/18 | Localização: BLX BPG 82P-31/CAB (80428762)

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